Os Castelos Fernando Pessoa Resumo
Os Castelos
Ulisses
O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.
Este que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos criou.
Assim a lenda se escorre
A entrar nas realidade,
E a fecundá-la decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.
Ulisses → sistematização
Pessoa remonta à figura mítica de Ulisses para explicar a fundação de Portugal.
Associadas à sua fundação, não está apenas o real, o factual histórico, mas
igualmente o mítico, dificilmente explicável – “O mito é o nada que é tudo”. Ulisses, “sem existir”, porque é mito, “nos bastou”, e “por não ter vindo”, porque não
é real “nos criou, ou seja, foi essencial para sermos hoje o povo que somos.
Ulisses é figura lendária do navegador errante, cujo espírito aventureiro o
levou a enfrentar o mar durante dez longos anos, vivendo e ultrapassando os
seus inúmeros e difíceis obstáculos, até, finalmente, aportar na sua ilha natal, Ítaca. Ulisses antecipa, assim, o destino de um Portugal voltado para a aventura marítima, celebrada na nossa história.
Embora não existindo, Ulisses aparece associado ao nascimento de Portugal, mais propriamente à cidade de Lisboa, o que evidencia, desde logo, a missão
espiritual de Mensagem. Ele representa o mito que, juntamente com a história,
dará vida a Portugal. Ele é o mito que fecunda a realidade, dando sentido à vida –
“A lenda se escorre a entrar na realidade/E a fecundá-la decorre”.
O paradoxo inicial (tese) – “O mito é o nada que é tudo” é a seguir demonstrado:
• O mito – a lenda – é o nada (não existe), mas, ao mesmo tempo, é tudo porque explica o real, fecundando-o: “Assim a lenda se escorre/A entrar na realidade,/E a fecundá-la decorre.”;
• A importância da referencia a Ulisses:
- Ulisses é um herói mítico – “Este, que aqui aportou,/Foi por não ser
existindo.”;
- A sua existência lendária não invalida a sua força criadora da identidade nacional – “Sem existir nos bastou./Por não ter vindo foi vindo/E nos criou.”;
- A sua ligação ao mar explica o destino marítimo dos portugueses;
• A terceira estrofe, iniciada pelo advérbio adjunto de modo “Assim”, sintetiza a tese inicial: com efeito, na terra – “Em baixo” – a vida real e objetiva –
“metade/De nada” – apaga-se para que o mito se engrandeça e eternize.
• Conclusão: Ulisses não é nada, porque é mito, explica o destino marítimo
dos portugueses, que é tudo. É irrelevante que os heróis fundadores tenham
ou não tido existência real, o que importa é que todos tenham funcionado
com a força do mito que, não existindo, é tudo.
Ulisses → intertextualidade
Canto VIII:
- Armada estacionada em Calecut
- Narrador: Paulo da Gama
- Narratário: Catual de Calecut
Vês outro, que do Tejo a terra pisa,
Depois de ter tão longo mar arado,
Onde muros perpétuos edifica,
E templo a Palas, que em memória fica?
Ulisses é o que faz a santa casa
A Deusa, que lhe dá língua facunda;
Que, se lá na Ásia Troia insigne abrasa,
Cá na Europa Lisboa ingente funda.
Tal como em Mensagem, Os Lusíadas recuperam a lenda fundadora de Ulisses, atribuindo-lhe a fundação de Lisboa.
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